Daniella Dolme - 06/03/2011 - 09h30
Uma decisão do TST (Tribunal Superior do Trabalho) divulgada na última semana trouxe à tona uma discussão recorrente no direito trabalhista: o trabalhador rural —mais especificamente, no caso, o cortador de cana— deve receber adicional de insalubridade por exposição ao sol e calor intenso?
A reportagem de Última Instância ouviu especialistas que, apesar de concordarem que a decisão formalmente foi correta, ou seja, que o ministro responsável pelo recurso no TST seguiu à risca o previsto na lei, indicaram alternativas para que a controvérsia chegue ao fim: a instrumentalização das decisões, fazendo com que os juízes levem em conta os laudos e provas de cada caso para decidir; a atualização constante da lista do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) que determina quais são as condições para se considerar um trabalho insalubre; e, a opção mais radical, uma alteração legislativa.
A professora Carla Romar, especialista em direito do trabalho, explicou que o pagamento de adicional de insalubridade depende de “previsão expressa na normatização de insalubridade feita pelo Ministério do Trabalho”. “A Justiça não pode condenar a empresa a pagar se não existir essa previsão legal”, ponderou.
Segundo a advogada, para evitar polêmicas, o próprio TST já possui uma orientação jurisprudencial (OJ 173) cujo texto estabelece que “o trabalhador exposto a raios solares não tem direito ao adicional de insalubridade por falta de previsão legal”.
A CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) prevê o pagamento do adicional, mas remete ao MTE a responsabilidade de fixar quais são os limites que tornam agentes químicos, físicos e biológicos motivos para caracterizar condições de trabalho como insalubres. Na Norma nº15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho, Anexo nº 3 [Limites de tolerância para exposição ao calor], determina-se que a exposição ao calor é considerada atividade insalubre, mas não há especificação para raios solares, cotidiano a que os cortadores de cana estão submetidos.
“Se fizeremos uma interpretação nua e crua do anexo que dispõe sobre o calor, não se vê a queimadura da pele pelo sol como fator que dê direito ao adicional de insalubridade”, observa a advogada trabalhista Patrícia Nagy Olah. Para ela, contudo, a questão é controversa justamente pela “interpretação do que diz o Anexo do calor”.
De acordo com ela, uma alternativa para solucionar o impasse seria “uma alteração na norma regulamentar, uma alteração legislativa para que o Judiciário possa atuar com mais ênfase, de uma forma mais efetiva”. Patrícia Olah acredita que, da maneira como está atualmente, a lei deixa o Judiciário “de mãos atadas”, uma vez que “o juiz está adstrito ao que dispõe a regulamentação infraconstitucional e decretos”.
Para Carla Romar, no entanto, a lei não deve ser alterada. “Alguém deve dizer quais são as atividades insalubres de uma forma concreta, objetiva e que todo mundo tenha conhecimento”, afirmou. Dessa forma, a professora propõe uma alternativa mais branda. “Talvez uma atualização na lista de atividades insalubres pelo Ministério do Trabalho, fazendo com que novas situações sejam incluídas e outras, que talvez já nem sejam mais insalubres, seja exluídas”.
Dura lex, sed lex
Por outro lado, o professor Maurício de Carvalho Salviano, mestre em direito das relações sociais com enfoque em direito do trabalho, critica o comportamento formalista do TST no caso. Para ele, a apresentação de laudo que comprove a nocividade da atividade à saúde do trabalhador já poderia garantir ao juiz a condenação da empresa para o pagamento de adicional de insalubridade. “O juiz tem condições de não ser formalista ao extremo e aguardar a vinda da lei, ou seja, o Ministério do Trabalho prever isso ou não”, afirmou.
Segundo Salviano a postura "dura lex, sed lex’" do TST, tem ido na contramão, inclusive, do que defende a Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas), que recomenda uma conduta mais instrumentalista, que busque sempre a saída “mais justa para o trabalhador”.
Entretanto, Carla Romar alerta para a possibilidade de se criar insegurança jurídica se a decisão for tomada pelos juízes do trabalho caso a caso. “Nós não podemos ficar na mão de peritos, porque cada um entende uma coisa. As atividades consideradas prejudiciais à saúde podem ser analisadas de uma forma muito subjetivas. O que é prejudicial para mim, pode não ser pra você”.
Fonte: http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticia/CORTAR+CANA+E+TRABALHO+INSALUBRE+ESPECIALISTAS+APONTAM+ALTERNATIVAS+A+DECISAO+DO+TST_73401.shtml?utm_source=twitterfeed&utm_medium=twitter
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